Como fazer a delimitação do tema na redação do Enem

Diante do tema que será oferecido no vestibular (e mesmo em classe ou em casa, nos treinamentos), há uma pergunta que nos surpreende e nos imobiliza, ainda que temporariamente: e agora, o que vou escrever sobre isso? Leve sempre em consideração que o tema proposto é a consequência e que você deverá, obrigatoriamente, procurar as causas para discutir o que quer dizer, defender, contestar. Que argumentos utilizar, então? Como escolher o que vai defender?

Eis aí a questão número um para quem vai iniciar um texto.

Há muitos perigos que se apresentam: se escolhermos muitos assuntos para a abordagem, chegaremos ao fim com uma redação extremamente superficial. O segredo é escolher e pinçar os enfoques da abordagem, ou seja, delimitar o tema para que possamos enfocar o assunto que pretendemos abordar. Para que isso aconteça bem, fizemos o roteiro abaixo e publicamos em outros de nossos sites algumas redações escritas no vestibular como exemplo de como isso deve ser feito.

Mas não se esqueça: ninguém escreve bem se não sabe bem sobre o que vai escrever…

Então, hora de pensar em se informar, ganhar convicções através da leitura de livros, jornais e revistas. Os temas oferecidos nos vestibulares são, geralmente, muito amplos. Partiremos de um exemplo real para fazermos os comentários sobre este assunto. Escolhemos, ainda que antigo, o tema da redação da Fuvest 2001:


Um dia sim, outro também. Duas bombas, suásticas nazistas e muitas mensagens pregando a tolerância zero a negros, judeus, homossexuais e nordestinos marcaram a Semana da Pátria em São Paulo. O primeiro petardo foi direcionado na segunda-feira 4, para o coordenador da Anistia Internacional.
Tratava-se de uma bomba caseira, postada numa agência dos Correios de Pinheiros com endereço certo: a casa do coordenador. Uma hora e meia depois, foi a vez de o secretário de Segurança e de os presidentes das comissões Municipal e Estadual de Direitos Humanos receberem cartas ameaçadoras. Assinando “Nós os skinheads” (cabeça raspada), os autores abusaram da linguagem chula, do ódio e da intolerância. “Vamos destruir todos os viados, pretos e nordestinos”, prometeram. Eles asseguravam também já terem escolhido os representantes daqueles
que não se enquadram no que chamam de “raça pura ” para receberem “alguns presentinhos “.
Como prometeram, era só o começo. No dia seguinte, terça-feira 5, o mesmo grupo mandou outra bomba, dessa vez para a associação da Parada do Orgulho Gay.

(Isto é, 08/09/2000)

Desde então [os anos 80], o poder racista alastrou-se por todo o mundo numa torrente de excessos sanguinolentos. Também na Alemanha, imigrantes e ‘refugiados foram mortos friamente por maltas de radicais de direita em atentados incendiários. Até hoje, a esfera pública minimiza tais crimes como obra de uns poucos jovens desclassificados. Na verdade, porém, o poder racista à solta nas ruas é o prenúncio de uma reviravolta nas condições atmosféricas mundiais.

(Robert Kurz)

Um dos eventos realizados no final de abril deste ano no Chile foi uma conferência internacional secreta de militantes extremistas de direita e organizações neonazistas planejada e divulgada pela Internet. Foram convidados a participar do “Primeiro Encontro Ideológico Internacional de Nacionalismo e Socialismo ” representantes do Brasil, Uruguai, Argentina, Venezuela e Estados Unidos.

(Isto é, 08/09/2000)

(…) Nos últimos anos, grupos neonazistas têm se multiplicado. Tanto nos Estados Unidos e na Europa quanto aqui parece existir uma relação entre o desemprego estrutural do sistema capitalista e a ascensão desses grupos de inspiração neonazista.

(Página da Internet)

Toda proclamação contra o fascismo que se abstenha de tocar nas relações sociais de que ele resulta como uma necessidade natural, é desprovida de sinceridade.

(Bertolt Brecht)

Considerar alguém como culpado, porque pertence a uma coletividade à qual ele não “escolheu” pertencer, não é característica própria só do racismo. Todo nacionalismo mais intenso, e até mesmo qualquer bairrismo, consideram sempre os outros (certos outros) como culpados por serem o que são, por pertencerem a uma coletividade à qual não escolheram pertencer. (…)

(Cornelius Castohadis)

“A violência é a base da educação de cada um.”

(Resposta de um cidadão anônimo entrevistado pela TV sobre as razões da violência)

Estes textos (adaptados das fontes citadas) apresentam notícias sobre o crescimento do neonazismo e do neofascismo e, também, alguns pontos de vista sobre o sentido desse fenômeno. Com base nesses textos e em outras informações e reflexões que julgue adequadas, redija uma dissertação em prosa, procurando argumentar de modo claro e consistente.

Como você pode observar, a redação exigida pela Fuvest 2001, embora proponha uma discussão sobre o neonazismo e o neofascismo e dos atos que se cometeram naquela época, é, de qualquer modo, genérica quando aponta, na última linha, possibilidade que se discuta também sobre a questão da violência e suas razões sociais, ou até mesmo, no corpo do primeiro trecho, que se desenvolvam questões sobre a violência contra as minorias (o primeiro texto da coletânea, preste bem atenção a isso, discute violência dos skinheads contra minorias; o segundo põe em evidência a questão “jovens e racismo” e, finalmente, o terceiro trecho observa, outra vez, a desfaçatez dos neonazistas).

Como fazer, então, para delimitar este tema?

  • Em primeiro lugar, não inicie sua escritura antes de ler atentamente o que se pede e, o mais importante, entender o que a proposta revela e deva ser efetivamente comentado;
  • Ao fazer isso, imagine o que você sabe sobre o assunto além do que contenha a coletânea: comece a separar os enfoques que quer desenvolver (importante: não confie muito na sua memória neste instante: anote, ainda que com indicadores apenas de palavras, o que gostaria de escrever, fazendo um breve esquema);
  • Uma boa saída para esses momentos, na tentativa de procurar a delimitação do tema e de como você pretende desenvolvê-lo, é fazer perguntas:

a)  Por que as minorias, sem serem culpadas de suas origens (se é que se pode falar em “culpas” aqui), são exaustivamente perseguidas no mundo atual?

b)  Quais são as minorias que mais sofrem preconceitos por parte dos skinheads, neofascistas ou mesmo da KKK americana?

c)  Por que alguns grupos, considerados oriundos do poder político, têm que gerar violência sobre os menos privilegiados, negando-lhes oportunidades iguais mesmo que ambos os grupos estejam inseridos em aparentes sistemas democráticos?

d)  O que é fascismo, nazismo e por que voltam ao tempo atual com tanta força se foram, a rigor, propostas terríveis e danosas para a humanidade? O que são sistemas xenófobos’ ou excludentes?

e)  Por que alguns jovens se voltam para defender o neonazismo ou neofascismo mesmo que sabedores de que tal defesa atenta contra as liberdades e garantias individuais das criaturas?

Depois de fazer algumas perguntas ou anotar fatos que você queira enfocar, verá que o que pretende escrever começará a ser delimitado, finalmente, segundo as suas possibilidades pessoais de dissertar sobre o assunto.
Não imagine que isso seja tarefa tão difícil. O segredo, na delimitação do que você pretenda enfocar sobre o assunto, é apenas um: estar bem informado sobre os fatos que acontecem na atualidade, sobretudo os acontecimentos que envolvam o Brasil.
E a pergunta, agora, será esta: só temas brasileiros acabam por cair nos vestibulares? Está claro que sim, mas considere as chamadas correlações com o que acontece no mundo. Leve, ainda, em consideração o que você aprendeu na organização dos argumentos: poderá optar por fazer trajetórias histórico-sociais ou aquelas que, de qualquer maneira, envolvam outros países do mundo.
É hora de imaginar que somos parte do todo globalizado e que todos os acontecimentos, certamente, sofrem injunções entre si.

IMPORTANTE!

Tenha muito cuidado quando delimitar o tema e escolher sobre o que quer falar no seu texto: se escolher cinco ou seis assuntos correlacionados, vai descobrir, no final, que apenas “passou de raspão” por todos eles, citou muitos exemplos, mas não se aprofundou em nenhum.

Ainda: você poderá optar, no caso do texto acima, por defender uma ideia central (a violência contra as minorias, por exemplo), e enfatizar que qualquer tipo de ato violento é condenável ou que tais atos são prenúncio de que os homens do planeta ainda não aprenderam o caminho do respeito que considera as diferenças, tradições, religiões, raças como riquezas absolutas e não como “defeitos” terríveis.

Você poderá conferir redações escritas pelos alunos nos links abaixo: