Como fazer uma redação sem erros no Enem
Uma das dúvidas mais comuns dos alunos quando se fala sobre o Exame Nacional do Ensino Médio é como fazer uma redação sem erros no Enem e que seja avaliada com a nota máxima. Nos cursinhos as aulas são voltadas para isso e até são premiados os alunos que obtém esta nota. O problema é que não existe uma receitinha que possa ser dada,. o que existe é um trabalho duro de escrita e prática de linguagem até que se alcance a competência necessária e desejável para fazer, e fazer bem, a redação dissertativa com tema de abordagem social e para o qual se espera uma proposta de intervenção aplicável.
A LÓGICA E OS ERROS DE RACIOCÍNIO
Othon Moacyr Garcia, em Comunicação em prosa moderna, afirma que, apesar de incorrermos em uma infindável variedade de erros, só existem mesmo, da perspectiva da lógica, três modos de errar.
Erramos quando raciocinamos mal com dados verdadeiros – erro na forma de raciocinar. Erramos quando raciocinamos bem com dados falsos – erro de avaliação dos dados, do conteúdo. E, finalmente, o que talvez seja mais comum e altamente indesejável, erramos quando raciocinamos mal com dados falsos – erro induzido por dados falsos.
Se ao argumentar por escrito ou oralmente nos prendemos a superstições e crendices, aderimos a erros cuja origem pode estar num tipo de raciocínio falacioso.
O que é um axioma?
Um axioma é um princípio ou uma verdade necessária tão evidente que dispensa demonstração. Nada pode ser e não ser ao mesmo tempo.
A soma dos ângulos internos de um triângulo é sempre igual a dois ângulos retos, ou 180°.
O que é um falso axioma?
Quando se transfere o status de axiomas para máximas em frases que exprimem inverdades ou verdades relativas ocorre o falso axioma.
- Quem não cola não sai da escola.
- Quem não estuda não vence na vida.
- Quem compra o que não pode, vende o que não deve.
- Quem não arrisca não petisca.
Note que o falso axioma apresenta como verdade incontestável e absoluta o que pode ser contestado e relativizado. Há muitos estudantes que não colam e obtêm sucesso na escola, por meio de estudo dedicado e sistemático. Pode-se até mesmo pensar numa oração que admita parcialmente a verdade da primeira oração, para logo depois interpor uma ressalva: quem cola sai da escola, mas não decola. O que também não deixa de ser parcialmente verdadeiro. Semelhantemente, não parece verdadeiro que estudar é condição exclusiva para o sucesso na vida. É possível haver quem não estude, mas se especialize em alguma habilidade prática que o torne bem-sucedido. Observe, ainda, a contradição dos dois últimos provérbios, a qual acentua seu caráter relativo.
Ao redigir textos argumentativos, portanto, é bom lembrar: uma abordagem que contemple as várias facetas do problema provoca maior adesão do leitor à proposta do texto e evita o desagradável efeito contrário de cair em descrédito pelo uso de um argumento falacioso.
O que é um estereótipo?
Lugar-comum ou conceito formado a priori, o estereótipo é alimentado pela ignorância no assunto, dando-se muito valor a supostas características de indivíduos de um mesmo grupo, sem considerar as diferenças entre eles.
Os japoneses são inteligentes.
Os turcos são sovinas.
Os brasileiros têm samba no pé.
Para expor a fraqueza e a falácia desse tipo de afirmação, basta mencionar o exemplo de japoneses que não sejam considerados inteligentes, turcos que são generosos, e brasileiros que não levam jeito algum para o samba.
O que é um dilema?
O dilema é um tipo de raciocínio pelo qual se apresentam duas proposições opostas para que delas seja extraída apenas uma opção ou conclusão lógica.
Quem cai em alto-mar e não sabe nadar, ou aceita o salva-vidas ou o afogamento.
O que é um falso dilema?
O falso dilema apresenta duas alternativas em situações em que há mais de duas.
Ou pagamos mais impostos e temos um país decente ou pagamos menos Impostos e temos um país caótico.
Repare que, no caso do falso dilema, a força de uma terceira hipótese conforme a qual é possível ter um país decente com uma carga tributária mais branda é “mascarada” pelo uso da conjunção alternativa ou… ou…, que gera a falácia.
O que é uma generalização não qualificada?
Afirmação de caráter geral, normalmente ligada ao senso comum, a generalização não qualificada é tida como falaciosa por falta de especificação ou qualificação de seus termos.
Tomar leite é essencial à saúde.
Quem lê bastante aprende a escrever com facilidade.
Observe este outro exemplo:
A prática de exercícios emagrece.
Aparentemente, trata-se de uma afirmação verdadeira, mas precisa ser especificada ou qualificada para que ganhe mais força persuasiva. Veja:
A explicação é a de que, nos exercícios aeróbicos, o corpo exige mais energia que nos anaeróbicos. Como tem mais tempo para produzi-la, a glicose se transforma em uma enzima que entra na estrutura da célula e reage com o oxigênio, produzindo muito ATP (uma espécie de carro-forte transportador de energia). Como a glicose é fundamental para o cérebro, o corpo evita gastá-la, lançando mão das moléculas de gordura para a produção de energia. Daí decorre o emagrecimento.
Observe, ainda, que não é qualquer tipo de exercício que é indicado para o emagrecimento, nem qualquer tipo de pessoa que emagrece por esse método. Quem não tem gordura para ser transformada em glicose não emagrecerá com a mesma facilidade fazendo exercícios aeróbicos.
A generalização não qualificada, portanto, necessita sempre de uma especificação para que deixe o terreno da falácia e passe ao da argumentação consistente.
O que é petição de princípio ou círculo vicioso?
O círculo vicioso é uma falácia que se caracteriza pela repetição, com outras palavras, do que já foi dito ou pressuposto na declaração anterior. Pode ser considerada um vício de linguagem.
Ele está desempregado porque foi obrigado a deixar o trabalho.
O país não progride porque não encontra o caminho para o desenvolvimento.
Os franceses são educados porque desde cedo aprenderam bons modos.
Comer gordura animal é nocivo à saúde porque faz mal ao organismo.
Esse tipo de falácia revela ausência de reflexão por parte de quem escreve. Não tem poder argumentativo, uma vez que se restringe à mera multiplicação de palavras, sem acrescentar justificativa razoável à declaração inicial. Não é difícil comprovar a fragilidade argumentativa de tais afirmações.
Quem acredita que a ingestão de gordura animal é nociva à saúde, por exemplo, necessariamente aceita que ela faça mal ao organismo. Consequentemente, é desnecessário falar isso. É mais persuasivo dizer:
Comer gordura animal é nocivo à saúde porque atrapalha a produção de uma substância necessária para manter as artérias flexíveis. Com o tempo, esse mau-hábito alimentar pode causar o enrijecimento das artérias, aumentando os riscos de doenças cardíacas e derrames.
O que é apelo ao medo na argumentação?
O uso da coerção pela ameaça de resultados indesejáveis, caso não se adote o ponto de vista apresentado, é um argumento falacioso que utiliza predominantemente a emoção.
Acho que você deve votar sim à proibição do comércio de armas de fogo, porque estas, mais dia, menos dia, acabarão caindo nas mãos dos bandidos que nos matarão.
Precisamos aceitar a concessão de novas praças de pedágios para termos mais estradas seguras, caso contrário a próxima vítima pode ser algum de nós.
Repare que nesse tipo de falácia, procura-se chegar à persuasão mais pela via emocional que pela racional. Apela-se mais à força da intimidação psicológica que à dos argumentos. Para desmontar esse tipo de erro de raciocínio, basta evidenciar a relação não necessária entre a ameaça e a verdade ou falsidade da tese principal.
Pode-se contradizer o argumento da primeira frase, por exemplo, negando a relação necessária entre o comércio
legal de armas de fogo e o prognóstico de que os bandidos nos matarão. Afinal, os bandidos podem, perfeitamente, continuar a matar, mesmo com a proibição desse comércio, dada a notória facilidade na aquisição de armas pelos caminhos tortuosos da ilegalidade.
O que é o apelo à piedade e à misericórdia na argumentação?
Outro raciocínio falacioso é o apelo aos sentimentos de piedade, misericórdia, ou ao fatalismo, ao azar e às forças sobrenaturais como estratégia de convencimento.
Você deve se casar com ele. Ele não tem ninguém no mundo, ficou órfão muito jovem, passou por grandes privações para estudar. Finalmente casou-se, mas quis o destino que perdesse a jovem esposa na viagem de lua de mel. Desde então, tem vivido sozinho e triste.
Mas eu não posso ficar com essa nota. Minha mãe sofre do coração, meu pai trabalha duro para pagar a mensalidade, eu pego dois ônibus todo dia para vir à escola. Além disso, eu estudei quatro horas para a prova.
A falácia desse tipo de raciocínio, como no caso anterior, está em deslocar o foco do plano das eventuais razões que fortaleceriam a tese principal para o plano das emoções. É evidente que há argumentos mais fortes para levar alguém a se casar que o sentimento de pena do provável companheiro. As pessoas se casam porque se amam, porque constatam haver compatibilidade de sonhos, projetos, expectativas.
Esse tipo de falácia é muito comum em tribunais do júri, quando advogados de defesa, incapazes de refutar as provas incontestáveis dos delitos praticados por seus clientes, fogem da verdade dos fatos, argumentando que foram “vítimas de uma fatalidade”, mas que “são bons pais de família”, “têm filhos para cuidar”, etc. O objetivo claro desse tipo de estratégia é fazer os jurados esquecerem a questão principal.
O que é o apelo ao público na argumentação?
Considerar correta uma afirmação porque muitos concordam com ela, num apelo ao público, como em:
As últimas pesquisas indicam a vitória do candidato Z Então, certamente ele vencerá a próxima eleição.
Todo mundo concorda em pagar pedágios, por que só você discordaria?
Vou comprar o último modelo de tablet. Todo mundo está comprando.
Logicamente, nem tudo que todos aprovam é verdadeiro por isso. Ocorre, com frequência, de a minoria estar com a razão.
Veja o resultado dos exames vestibulares nas grandes universidades, por exemplo. É muito maior o número dos reprovados que o dos aprovados.
O que é uma generalização apressada?
Extrair uma conclusão a partir de uma generalização apressada, baseando-se em dados, evidências ou amostras insuficientes, é outro exemplo de raciocínio falacioso.
Conheci dois universitários alemães que eram racistas. Fulano é alemão. Logo, ele é também racista.
O prefeito e os vereadores da cidade X aprovaram a localização da nova praça de pedágio em seu município; logo, todos os moradores da cidade concordam com a praça de pedágio.
Eu não gosto de Matemática, o Antônio Carlos não gosta de Matemática, meu primo Caíque também não; então, só posso concluir que ninguém gosta de Matemática.
Encontrei uma laranja podre no cesto; por isso joguei todas as laranjas no lixo.
Naturalmente, em algumas condições, é possível extrair conclusões a partir de uma pequena amostragem de dados, mas um prefeito e treze vereadores não podem servir de amostra para um ajuizamento sobre a opinião de todos os quarenta mil moradores da cidade X acerca da localização da nova praça de pedágio.
Essa é uma falácia relativamente comum, que induz muitas pessoas ao preconceito.
O que é uma analogia falsa ou imprópria?
Comparar coisas ou situações que apresentam alguns aspectos semelhantes visíveis, supondo que essa semelhança se dê também em relação aos aspectos invisíveis, consiste em uma analogia falsa ou imprópria.
Dirigir um automóvel é como pilotar patinete; em ambos os casos, deve-se saber antes para onde se vai.
Ser altruísta é como fritar bolinhos: se você coloca muito óleo, encharca, se põe de menos, queima.
Resolver um grande problema é como comer uma torta: come-se um pedaço de cada vez.
A falta de luz é um grande problema para quem precisa dela para estudar à noite. Pode, porém, ser resolvido com a simples troca de uma lâmpada.
No caso de falsa analogia, o raciocínio é enganoso porque não é possível comparar situações tão diferentes. Por exemplo, a única semelhança que há entre resolver um grande problema e comer uma torta é o fato de que nas duas situações é possível realizar a ação em etapas menores. E por isso mesmo essa analogia é contestável, pois há grandes problemas que são resolvidos numa etapa só.
No caso da falta de luz, propõe-se que o problema seja resolvido com a simples troca de uma lâmpada, mas isso apenas no caso de haver insuficiência de luz para o estudo à noite, ou de a lâmpada estar queimada, não no caso de privarão de energia elétrica ou alguma outra falha no sistema elétrico. Percebe-se, assim, a fraqueza da falsa analogia.
O que é a falácia da ignorância na argumentação?
A falácia da ignorância consiste em usar a ausência de provas ou a inabilidade do oponente para apresentá-las como evidência da verdade ou falsidade de uma afirmação.
É claro que mula sem cabeça existe. Que eu saiba ninguém nunca se conseguiu provar que não existe.
Ninguém nunca encontrou a Arca de Noé, encontrou? Então, posso concluir que ela não existe.
O argumento baseado na falta de provas é falacioso porque a ausência de comprovação não é comprovação de ausência, ou seja, se não posso provar a existência de uma estrela ou galáxia ainda desconhecida para mim, não significa que ela não exista. Não há vínculo lógico entre a coisa, a situação e a prova de sua existência.
O que é o apelo à autoridade na argumentação?
Outro exemplo de raciocínio falacioso é invocar a opinião de especialista ou autoridade fora de seu campo, ou mesmo em seu campo de conhecimento e de atuação, mas para opinar sobre assuntos polêmicos, em que há muita divergência.
Segundo Maradona, o mais famoso craque do futebol argentino, ingerir carne gordurosa faz bem à saúde do coração. Portanto, podemos comer tranquilos, sem riscos para o coração.
As motos da Yamaha são as melhores do planeta, porque até Billy Grahan, o famoso pregador norte-americano, comprou uma e afirmou que não se arrependeu de sua escolha.
Lucy Hutyra, famosa pesquisadora de Harvard, afirmou que grande extensão da Amazônia pode se transformar, com o aquecimento global, em um enorme cerrado. Isso significa que vamos perder a Amazônia.
Segundo o cientista brasileiro Carlos Nobre, a Floresta Amazônica pode resistir ao aquecimento global, graças à profundidade de suas raízes. A Amazônia, portanto, está salva.
O recurso à autoridade é uma estratégia muito comum na produção de discursos argumentativos, mas requer de quem escreve boa dose de cautela. Mencionar Maradona como autoridade médica beira ao ridículo, o mesmo poderia ser dito da citação de Billy Grahan para afirmar a qualidade das motos Yamaha.
Nos dois últimos exemplos, o problema é outro: recorre-se à opinião de peritos em sua área de conhecimento, mas não há unanimidade quanto ao assunto tratado. Um bom texto sobre o aquecimento global não pode deixar de apresentar uma abordagem que contemple a polifonia – as múltiplas vozes que se pronunciam sobre o assunto – sob o risco de ser considerado tendencioso ou revelar falta de reflexão. No caso dos dois últimos exemplos, a opinião dos especialistas foi mal utilizada, originando afirmativas falaciosas.
O que é o apelo à autoridade anônima?
Outro tipo de falácia parecida, mas lamentavelmente bastante comum nos textos, é a referência a uma autoridade anônima, que mergulha a argumentação na incerteza, uma vez que não dá ao oponente o benefício de comprovar se se trata ou não de um especialista. Esse erro de apelar a um “perito” sem nome é, com frequência, acompanhado por outro de natureza parecida: apela-se ao boato, ao rumor. Novamente se recorre a uma fonte que tira do auditório, do oponente, o benefício da verificação da origem da declaração. Observe:
Um ambientalista famoso afirmou que a Amazônia vai sobreviver ao aquecimento global. Os brasileiros podem, por conseguinte, dormir tranquilos.
Os índices inflacionários vão cair nos próximos meses, segundo um funcionário de alto escalão do governo.
Os especialistas dizem que aplicar creme natural de tomate com pepino é bom para combater a calvície.
Andam dizendo que a Petrobras vai pedir concordata.
Sabe-se que a melhor solução para a crise energética é plantar cana-de-açúcar e mamona.
O que é a falácia da falsa causa na argumentação?
Com o erro de raciocínio da falsa causa supõe-se que, se uma coisa acontece logo depois de outra, é porque aquela constitui a causa desta.
O pequeno sitiante foi fulminado por um raio logo depois de se olhar no espelho; para o bom entendedor, meia palavra basta: nunca fique perto de espelhos em dia de tempestade, porque espelhos atraem raios.
Meu canário-do-reino morreu logo depois que o mostrei a um homem que desejava comprá-lo. Não mostre seus animais de estimação para nenhum desconhecido, porque tem gente que tem mau-olhado.
O prefeito morreu logo depois de submeter-se a radioterapia. Por isso, se estiver com câncer, não faça radioterapia, porque esse tratamento mata.
Não aponte o dedo para o céu, que dá verruga. É verdade! Tenho um amigo que fez isso e, no dia seguinte, lá estava uma bela de uma verruga na ponta do indicador.
Não se pode deixar de observar que a sucessão temporal não é responsável pelos eventos, isto é, não é porque uma coisa acontece depois de outra que se transforma imediatamente em sua causa.
Imagine que alguém chegue atrasado à aula e, assim que entra em classe, um colega saia para ir ao sanitário. Conclusão: chegar atrasado faz alguém ir ao sanitário. Pode ser enganador, portanto, o argumento que vincula a sucessão temporal à relação de causa e efeito. Por outro lado, há situações em que isso pode ser verdadeiro. Alguém pode sair de um ambiente por causa da entrada de um conhecido inimigo.
Outro aspecto importante: a falácia da falsa causa ocorre também quando o que se considera como causa de um evento na verdade não é, ou é apenas parcialmente. Observe:
A imoralidade presente no mundo atual é resultado dos programas de TV e do cinema.
A pobreza e a miséria são resultado da preguiça das populações da periferia.
É claro que a preguiça pode trazer a pobreza, mas esta não é sua única causa. Preguiça, pobreza e miséria podem ser consequências de causas mais complexas e abrangentes como a falta de políticas de inclusão social. De modo semelhante, não se pode atribuir à TV e ao cinema a total responsabilidade pela imoralidade, pois os comportamentos imorais existiram antes do advento da televisão e do cinema.
O que é uma hipótese contrária ao fato na redação dissertativa?
A hipótese contrária ao fato consiste em um erro de interpretação do evento. Parte-se de uma hipótese insustentável e chega-se a uma conclusão errada do ponto de vista lógico.
Se uma maçã não tivesse caído sobre Isaac Newton, o mundo não teria conhecido a lei da gravidade.
Se não fosse a ajuda que eu lhe dei, você não teria se tornado advogado.
Em ambos os casos, a hipótese não tem relação de causalidade com a conclusão. A lei da gravidade seria conhecida de alguma forma, sem a necessidade da história da maçã. O mesmo pode-se dizer no segundo exemplo. Tornar-se advogado depende de um conjunto de fatores e não exclusivamente de uma ajuda específica no início da carreira. Sem essa ajuda, haveria certamente outras formas de alcançar o objetivo.
Pode-se ver esta falácia como uma subcategoria da falácia anterior, já que não se pode dizer que a queda da famosa maçã foi causa de descoberta da lei da gravidade.
O que é a falácia chamada de redução ao absurdo?
Também conhecida como encosta escorregadia ou bola de neve, a redução ao absurdo se resume em tirar de uma declaração considerada inaceitável várias conclusões encadeadas umas às outras, como uma bola de neve descendo uma ladeira escorregadia, até que a proposição inicial seja reduzida a uma consequência absurda e indesejável.
Se eu emprestar meu notebook para você, então vou ter de emprestá-lo também ao João Eustáquio; se emprestar a ele, vou ter de emprestá-lo também ao irmão dele; se fizer isso, serei obrigado a emprestá-lo para todos os alunos da escola.
Se você aceitar fazer um favor para ele hoje, então vai ter de ajudá-lo também amanhã; se ajudá-lo amanhã, então terá de fazê-lo também depois de amanhã e pelo resto da semana; se auxiliá-lo por uma semana, então ele o constrangerá a ajudá-lo por um mês inteiro, transformando-o em seu escravo.
Se aceitarmos pagar uma pequena taxa anual de impostos pelo ar que respiramos hoje, amanhã será mais fácil aceitar uma taxa maior; se concordarmos com essa taxa maior, então estaremos pavimentando o espírito para a aceitação passiva de taxas cada vez mais vultosas, até que aceitemos pagar, com resignação e naturalidade, um carne com doze mensalidades, pelo simples direito de respirar.
O ponto fraco de tal falácia está justamente na possibilidade de se aceitar a primeira conclusão, sem que seja necessário aceitar nenhuma de suas consequentes. Posso aceitar emprestar meu notebook para alguém, sem que isso implique em emprestá-lo, necessariamente, a muita gente.
O que é o apelo à antiguidade e à tradição?
O apelo à antiguidade e à tradição consiste em considerar algo como bom ou correto porque sempre se fez assim.
A melhor comida é a feita à moda antiga, em fogão a lenha.
Os antigos é que sabiam das coisas, pois já usavam o melhor medicamento para cálculos renais que se conhece – o popular chá de quebra-pedra.
O que é o apelo à novidade na argumentação?
Outro raciocínio falacioso, o apelo à novidade, é considerar algo como bom ou correto só porque é novo ou acabou de ser lançado.
Vou comprar um violino da Yamaha, é o mais novo lançamento do segmento dos instrumentos musicais.
Saiu o novo iPod da Apple. A corrida às lojas já começou por parte daqueles que só se contentam com a última palavra em tecnologia e qualidade.
Tanto o apelo à antiguidade como o apelo à novidade são, em si mesmos, argumentos falaciosos. É conhecida a preferência por violinos antigos, porque têm melhor qualidade de som. De forma semelhante e por outro lado, há deliciosos pratos da culinária que são feitos em fogões ultramodernos. Assim, o fato de algo ser bom ou correto não tem relação palpável com o fato de ser novo ou antigo.
O que é a falácia do “homem de palha” ou espantalho?
A criação de um simulacro da opinião do oponente, a chamada falácia do “espantalho”, evita enfrentar seu melhor argumento e ataca o mais frágil, ou interpretado tendenciosamente como mais fraco, criando, assim, uma posição discursiva que seja fácil de ser refutada para, em seguida, atribuí-la ao adversário. Luta-se, desse modo, não com o adversário, mas com seu “espantalho”.
O meu opositor defende a descriminalização da maconha. Se ele for eleito, nosso estado vai abrir as portas para os traficantes!
Quando os nossos adversários defendem o fim da impunidade dos militares que, segundo eles, praticaram crime de tortura, não estão preocupados com a justiça; tudo o que querem é o revanchismo, para usar os mesmos meios de que nos acusam.
Devemos manter a prova como um recurso de avaliação. Os que não desejam fazer prova estão defendendo o que lhes convém. Mas precisam admitir que há coisas mais importantes que a satisfação de conveniências pessoais.
Note que a estratégia argumentativa do espantalho consiste em caricaturar a opinião oposta para que fique mais fácil refutá-la.
É inegável, no segundo exemplo, que a substituição do tema da discussão – a punição de militares torturadores – pelo do revanchismo desvia o foco do debate para um tema mais fácil de ser refutado. Transforma-se, assim, em falácia porque deixa de lidar com os verdadeiros argumentos apresentados pelo oponente. Isso também vale para os outros casos.
O que é o ataque à pessoa ou envenenamento do poço?
A falácia do ataque à pessoa consiste em fugir ao debate pela via do ataque e ofensa ao oponente, em lugar de considerar seus argumentos.
O “poço envenenado” refere-se a acusações e ao descrédito impostos a alguém de forma que tudo que ela disser não terá credibilidade alguma, frente à desconfiança relacionada à pessoa ou a sua imagem.
Ele não pode dizer nada sobre honestidade. Não leva seus negócios a sério, deve na praça e trai sua mulher.
O quê? Como pode estar falando em princípios religiosos, se não vai a igreja, não sabe sequer rezar o Pai Nosso?
Esse tipo de falácia é amplamente utilizado nas campanhas políticas, consiste em ataques pessoais a candidatos rivais, colando a imagem do oponente a acontecimentos que “envenenam” a imagem política do candidato.
É isso. Você, que já fez sua inscrição para o Enem, ficou conhecendo uma série de modelos de argumentos considerados falaciosos por não serem fundamentados de forma consistente e irrefutável. Veja ainda os exercícios de interpretação e classificação dos tipos de argumentos nos textos dissertativos.